Uma das componentes que me parece mais interessante de interpretar na simbologia cemiterial é a da flora.

Em todos os casos com que me deparei durante muito tempo, a simbologia da planta obrigou sempre à sua interpretação, nunca tendo um significado literal.
Por exemplo: o trevo comum - de três folhas - é normalmente usado para representar a Santíssima Trindade, mas acabou também por representar a Irlanda, uma vez que, segundo a lenda, São Patrício - para além de ter expulsado as serpentes - levou consigo o trevo e espalhou-o pela ilha, em representação, precisamente, da Santíssima Trindade. Assim, quando encontramos um trevo numa campa, é muito possível que estejamos na presença da campa de um irlandês ou de um católico devoto.
Também é preciso considerar as modas e escolhas estéticas. Não é incomum encontrarmos várias campas seguidas com simbologia ou monumentos semelhantes: uma vezes, porque é uma só família (e foi essa a forma encontrada para a representar); outras, porque a escolha foi puramente estética - muitas vezes feita por catálogo, de acordo com as amostras que o artesão tinha na oficina ou com base naquilo que se viu no cemitério numa visita anterior.
No entanto, no caso de Portugal - até agora ainda não me cruzei com este fenómeno em outros países - existe, pelo menos, um caso de literalidade.

As Perpétuas são plantas conhecidas por florirem em canudinhos ou bolinhas - conhecidas também pelo chá que se faz com elas: em especial, o de perpétuas roxas; favorito da fadista Amália - e a Saudade tem uma representação parecida com a do cardo, podendo até ser confundida com este.
Juntas, não carecem de mais interpretação: significam "Perpétua Saudade" ou "Saudade Perpétua".
Resta realçar que, no nosso país, estas duas flores foram utilizadas frescas para enfeitar as campas. Em 1872, Ramalho Ortigão descrevia os cemitérios lisboetas da seguinte forma:
«Chegámos ao cemitério. Das grades que circulam os jazigos pendem coroas de perpétuas cor de milho estreladas de saudades roxas. Dentro dos carneiros ardem velas de cera, vicejam ramos de flores tristes e simbólicas em vasos de porcelana; e longos bambolins de crepes adornam as lápides tumulares de dísticos de ouro em fundo negro. Algumas senhoras de vestidos pretos passam silenciosas e graves. À porta algumas carruagens esperam. Eis tudo o que vimos no cemitério.»
http://www.orienteeterno.org/2012/10/flora-petrea-en-los-cementerios.html
ResponderEliminarUn trabajo sobre Flora Petrea
Obrigada pela partilha desse excelente artigo.
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