15.9.23

«Casa de Autópsias»: do modelo parisiense ao cemitério enquanto substituto da Morgue na Lisboa de Oitocentos

Há uns anos atrás descobri que, na Paris do século XIX, se visitava a Morgue da cidade como quem vai ao teatro ou ao jardim.

Fiquei fascinada com o tema e fui comprando livros e procurando fontes e até escrevi um pequeno texto aqui para o blog

Em 2021 e 2022 tive a oportunidade de investigar o tema com maior profundidade, procurando também a resposta lisboeta para os problemas que eram endereçados pela Morgue de Paris.

Escrevi um artigo que é agora publicado no segundo número da Revista RomantHis, uma revista científica de acesso aberto sobre o Longo Século XIX no Mundo Português, entendido num sentido lato, enquadrando quatro grandes vertentes: História, Arte, Cultura e Património.

A revista é uma publicação periódica digital é da responsabilidade do Grupo "Saudade Perpétua" e propriedade da HistóriaSábias - Associação Cultural, coordenada por Francisco Queiroz (director), Cristina Moscatel (directora adjunta).


Podem ler o meu artigo «Casa de Autópsias»: do modelo parisiense ao cemitério enquanto substituto da Morgue na Lisboa de Oitocentos seguindo esta ligação.

Este é ainda um tema em desenvolvimento e com várias linhas de investigação em aberto, mas o meu artigo pretende, desde já, ajudar a olhar para os cemitérios de outra forma e a procurar mais pistas e informações.

Espero que gostem.


23.5.23

O Crime dos Prazeres

A 21 de Maio de 2023 assinala-se o centenário da morte do 9.º Conde de Sabugosa: António Maria Vasco de Melo Silva César e Meneses, escritor, historiador, diplomata e mordomo-mor da Casa Real portuguesa. Figura incontornável das letras portuguesas na passagem do século XIX para o XX, integrou o grupo Vencidos da Vida (tendo sido até o penúltimo elemento a falecer, poucas semanas antes do poeta Guerra Junqueiro), expirando aos 71 anos.
O funeral foi agendado para o dia seguinte no cemitério dos Prazeres, para o jazigo particular n.º1587 (construído em 1866) – o mesmo que albergou temporariamente em 1915 os restos mortais de Ramalho Ortigão, outro Vencido da Vida, enquanto a família deste mandava construir o jazigo que agora o acolhe no cemitério do Alto de São João. 
Esperava-se uma enchente no cemitério dos Prazeres para o funeral do Conde de Sabugosa e o polícia a quem foi confiada a tarefa de manter a ordem durante a cerimónia diria depois ao jornal O Século que um pressentimento o levara a pedir reforços à esquadra da Estrela, que lhe enviara os polícias de piquete. 

Arquivo Fotográfico do jornal O Século
Torre do Tombo 
Perto das 17:00 horas, já terminada a cerimónia e quando muitos dos acompanhantes se retiravam, aconteceu o impensável: o silêncio murmurante do cemitério foi rasgado por três tiros de pistola. Na altura, houve quem dissesse terem sido cinco, mas foram três – suficientes para matar um homem. 
Por entre as sombras dos ciprestes, encoberto pelos jazigos e perscrutando a multidão, António Nunes Canha aguardara Adolfo do Couto Viana, o gerente da fábrica da Companhia União Fabril (CUF) nas Fontaínhas, que tinha ido ao funeral do Conde de Sabugosa em representação de Manuel José de Melo: director da CUF e sobrinho do falecido. Pouco tempo antes, Nunes Canha fora despedido por Adolfo Viana; no dia do funeral, vendo-o passar a caminho do cemitério, seguiu a carruagem e decidiu recorrer à violência. Por entre gritos e corridas, Adolfo Viana perdia a vida, sangrando no chão sagrado do cemitério. 
Talvez em choque por ter tido sucesso no atentado, Nunes Canha deixou-se agarrar pelos polícias que escoltavam o cortejo fúnebre, sendo levado para o interior do edifício da administração do cemitério, junto do portão principal, enquanto a multidão regressava, irada, apercebendo-se do que se passara no cemitério. O corpo inerte de Adolfo Viana, que o Dr. Melo Breyner – também presente no funeral – declarou morto, indignava a multidão, que gritava pelo assassino, apelando à justiça popular. 

Arquivo Fotográfico do jornal O Século
Torre do Tombo 
O fotógrafo do jornal O Século que registou a procissão fúnebre e a entrada do caixão no cemitério teve autorização para entrar na sala onde Nunes Canha esperava com a polícia e fotografou-o, com uma expressão entre a ausência e a estupefacção: «Tanto me faz. Façam de mim o que quizerem» , reporta ter-lhe dito o criminoso quando pediu para o fotografar. Cerca de uma hora e meia depois, quando finalmente a multidão dispersou o suficiente para saírem com segurança do edifício da administração do cemitério, o fotógrafo captou o momento em partiram em direcção à cadeia do Limoeiro. O cocheiro de Adolfo Viana ainda deitou as mãos ao autor do atentado com ganas de o esganar, mas a polícia evitou-o. 
Nesse mesmo dia, na Câmara de Deputados, Paulo Cancela de Abreu, que estivera presente no funeral e por isso chegou a meio da sessão, declarou ter presenciado «o vil atentado contra o gerente da Companhia União Fabril, que o vitimou» . O seu depoimento causou sensação na câmara e o Crime dos Prazeres, como popularmente ficou conhecido, ficou ainda associado a outra situação de violência, quando à porta do Parlamento um soldado da Guarda Republicana atacou o deputado Carvalho da Silva. 
O resultado destes acontecimentos inesperados foi o de as reportagens das exéquias do Conde de Sabugosa terem sido reduzidas para dar espaço ao relato do atentado, aos detalhes sobre a vítima, sobre a vida do assassino e os seus antecedentes criminais. E, claro, dois dias depois reportava-se um novo funeral: Adolfo Viana, abatido no funeral anterior, seguindo da igreja de São Domingos para o jazigo de família no cemitério do Alto de São João. O destaque dado pelos jornais foi para a multidão que se juntou em torno da igreja, nas ruas adjacentes e para a presença notória de muitos operários. 

Arquivo Fotográfico do jornal O Século
Torre do Tombo 
Num período conturbado, com greves, atentados e bombas, o crime foi lido como um atentado político, uma afirmação ideológica. Os ânimos exaltaram-se com um assassinato perpetrado em público num cenário e um momento completamente inesperados – um cemitério e no final de um funeral. Discutiu-se a culpa de Nunes Canha e o impacto que o seu despedimento havia tido na sua conduta. Houve, inclusivamente, alguns discursos que quase procuravam justificar o acto de Nunes Canha com o seu despedimento. Nos dias que se seguiram recuperou-se o passado sindicalista do autor dos disparos e o seu papel na organização da Associação de Classe do Pessoal da União Fabril e na criação e presidência do Sindicato das Associações Rurais do Ribatejo. Até se recordou uma anterior tentativa de assassinato, quando quatro anos antes, durante a greve dos metalúrgicos, Nunes Canha atentara contra um industrial na Rua da Junqueira (acabando absolvido pelo tribunal depois de dois anos de prisão). E o caso foi-se arrastando nos tribunais, sem desfecho. 

Arquivo Fotográfico do jornal O Século
Torre do Tombo 

Sabemos que em 1925, dois anos depois do sucedido, o caso continuava por julgar no tribunal da Boa Hora por incapacidade de assegurar o número suficiente de jurados para formar um júri. Nunes Canha terá sido sentenciado ao degredo em África (de onde regressou, temporariamente, em 1942, por motivos de saúde), facto atestado por uma circular escrita por seus correligionários que procurava apoio financeiro que lhe permitisse continuar na metrópole, mas perdemos-lhe o rasto. 


O caso do Crime dos Prazeres é único em Portugal, corporizando um assassinato premeditado, perpetrado no interior de um cemitério, após um funeral.


13.4.23

Boletim Cultural dos Cemitérios de Lisboa - Número 1

Esta semana chegou o novo número do Boletim Cultural dos Cemitérios de Lisboa.

Entre o conjunto de artigos variados e de conteúdo muito interessante - sempre cemiterial, obviamente - podem encontrar o meu artigo preliminar Casas Económicas e Prédios de Rendimento: O Bairro do Estado Novo, precisamente sobre este conjunto de construções no cemitério do Alto de Sáo João, em Lisboa, mas cujas características podem ser encontradas em construções funerárias um pouco por todo o país.


Podem aceder ao Boletim Cultural dos Cemitérios de Lisboa a partir deste link.


5.2.23

A Casa Portuguesa nos Cemitérios no GetLisbon

 A fantástica página GetLisbon, que se dedica a partilhar os aspectos mais peculiares de Lisboa desde 2017 - se ainda não seguem nas redes sociais nem recebem a newsletter por email, cliquem aqui e vão até lá - convidou-me para escrever um texto sobre A Casa Portuguesa nos Cemitérios, uma temática a cujo estudo me dedico há já alguns anos.

Passem por lá e leiam. 


Obrigada pelo convite!


24.9.22

Boletim Cultural dos Cemitérios de Lisboa - Número 0

 Esta semana chegou às nossas caixas de email a seguinte comunicação a partir da lista de distribuição dos Cemitérios de Lisboa:

Este é o primeiro número do novo Boletim Cultural dos Cemitérios de Lisboa.

Temos vindo a partilhar ao longo dos últimos meses uma efeméride mensal, em que se revela uma figura pública inumada nos nossos Cemitérios.

O passo seguinte desta partilha de conhecimento é a publicação deste Boletim, que terá uma periodicidade bi-anual.


Para aceder, clique aqui.

 

9.9.22

Lista de Distribuição dos Cemitérios de Lisboa

A Divisão de Gestão Cemiterial da Câmara Municipal de Lisboa tem uma lista de distribuição para a recepção da programação mensal relativa a visitas, apresentações, exposições e as efemérides mensais.


 



6.12.20

Flores de Pedra - Exposição

A exposição "Flores de Pedra / Flowers of Stone", no âmbito de Lisboa Capital Verde Europeia 2020, foi inaugurada no passado dia 4 de Dezembro pelo Sr. Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes e está patente na Galeria de Exposições da Capela do Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, onde pode ser visitada todos os dias até às 16:00.

Nascida de uma ideia de Sara Gonçalves, directora dos cemitérios de Lisboa, o projecto pretendeu reunir uma equipa multidisciplicar, com especialistas em botânica e simbologia, de forma a identificar as espécies de plantas que decoram os nossos cemitérios e descobrir os seus significados, tendo em conta o contexto cemiterial.

Foram vários meses de trabalho dedicado que incluíram visitas de campo, sessões fotográficas extensas, análise detalhada de imagens, pesquisa e análise de espécies, pesquisa histórica e simbólica, investigação de material de época, recuperação e restauro de peças de jazigos abandonados, concepção do projecto museológico e design, entre tantas outras tarefas essenciais para levar um trabalho como este a bom porto.

A utilização de livros e materiais do século XIX relativos à então popular Linguagem das Flores, contemporânea da maior parte dos jazigos fotografados e presentes nos nossos cemitérios permitiu enriquecer e contextualizar com maior acuidade a interpretação simbólica.


A componente da botânica ficou a cargo da Sandra Mesquita, a simbologia é da responsabilidade de Gisela Monteiro e o design e projecto museológico é de José Dias.

Vão visitar: prometemos que vai valer a pena!

Da esquerda para direita: Gisela Monteiro, Sandra Mesquita e Sara Gonçalves.


31.10.20

Asclépio, Hermes e Higia nos Cemitérios

Ao visitar um cemitério romântico, nas zonas mais antigas, onde se erguem os jazigos-capela e as sepulturas perpétuas, é comum encontrar curiosas figuras talhadas na pedra, sozinhas ou adornando epitáfios: flores, animais, instrumentos de trabalho, letras gregas, objectos do dia-a-dia, figuras humanas, símbolos de ordens. 

Cemitério dos Prazeres, Lisboa, Portugal

Quando tentamos perceber o seu significado dentro do espaço cemiterial, transparece que a escolha não foi aleatória, ainda que alguns dos donos de obra possam ter escolhido a decoração do seu jazigo a partir de catálogos ou pedindo para copiar algo que viram numa das suas visitas de domingo ao cemitério local.

Identificar e decifrar essas figuras ajuda-nos a saber mais sobre quem é a pessoa que se encontra enterrada no local, a forma como ela se via ou era vista pelos outros, aquilo de que mais gostava ou mais valorizada em vida.
Algumas das figuras não nos levam a interpretações complicadas e a recorrer dos compêndios e almaços antigos, por conseguirmos reconhecer o símbolo apresentado, por ele ainda fazer parte da nossa actualidade. E porque, por vezes, uma rosa é, realmente, apenas uma flor.

Um dos conjuntos de símbolos que parecem fáceis de identificar e decifrar são os símbolos associados à medicina e saúde. Estamos habituados a vê-los pintados em ambulâncias, representados nos placards luminosos das farmácias, nos logótipos de serviços de saúde. São normalmente compostos por serpentes enroladas em varas, árvores, taças, lamparinas de azeite.
Parece bastante claro e simples, mas porquê as variações?

Acontece que, efectivamente, estamos a falar de símbolos diferentes. 

Os que chegaram até nós mantendo o significado original são o Bastão de Asclépio e a Taça de Higia. 
Hermes representando o Comércio - Cemitério dos Prazeres,
Lisboa, Portugal
Pelo meio, aparece o Bastão de Hermes, normalmente designado de Caduceu, que inicialmente não estava associado à medicina e, por esse motivo causa alguma confusão no contexto cemiterial, onde aparece muitas vezes como representação do comércio. 

A sua associação formal à medicina surge no início do século XX, no corpo médico do exército dos Estados Unidos, que o adoptou como símbolo, ainda que existam algumas correntes que a colocam vários séculos antes, como extensão da associação de Hermes à Alquimia.
Este erro surge da utilização do caduceu nos exércitos romanos para identificar os mensageiros que, transportando um estandarte com este símbolo tinham salvo-conduto para se deslocarem no campo de batalha sem serem alvos de violência. Talvez fosse esse o objectivo inicial da selecção deste símbolo para identificar os elementos do corpo médico do exército, mas a consequência foi este ficar associado à medicina.

Podemos descrever estes símbolos, simplificadamente, da seguinte forma:
  • O Bastão de Asclépio é uma vara de madeira onde se enrola uma - e apenas uma - serpente.
  • A Taça de Higia é uma taça ou um cálice, no pé da qual se enrola uma serpente, que parece beber da taça.
  • O Caduceu é um bastão de ouro com duas serpentes enroladas, uma de cada lado; no topo do bastão aparece um par de asas e, por vezes, também o capacete de Hermes.
Para distinguir os dois bastões basta ter em atenção o número de serpentes: uma é Asclépio, duas é Hermes.

Conforme referi, Hermes não estava associado à medicina na antiguidade clássica, ao contrário de Asclépio e Higia. 
Hermes era o mensageiro de Zeus e dos deuses nos Infernos: Hades e Perséfone. Era considerado o patrono do comércio, dos ladrões, dos viajantes e dos mensageiros. 

Caduceu /Bastão de Hermes - Cemitério do Alto de São João,
Lisboa, Portugal
O caduceu era, originalmente, um cajado de ouro usado por Apolo enquanto pastoreava gado.
Conta a lenda que Hermes recebeu de Apolo esse cajado em troca de um instrumento musical: numa versão, diz-se que Hermes criou uma lira a partir de uma carapaça de tartaruga e tripas de uns bois que sacrificará aos deuses e que foi esse o instrumento trocado com Apolo; noutra versão, Apolo já teria obtido a lira em troca de um rebanho e dessa vez, para obter a flauta inventada por Hermes, teve de dar em troca o seu cajado. 
Quando recebeu o cajado de Apolo este era apenas uma vara de ouro, sem as serpentes. Depois de receber o cajado, Hermes dirigiu-se a Arcádia, quando chegou encontrou duas serpentes lutavam e se mordiam. Tentando separá-las com o cajado, elas enrolaram-se neste e pararam a violência, mantendo-se em equilíbrio. 

O caduceu é o símbolo identificador de Hermes, assim como a tesoura e o fio são o símbolo identificador de Átropos, por exemplo.

De notar ainda a ligação de Hermes ao mundo dos mortos: este era conhecido como "Acompanhante de Almas" - deus psicopompo - por ser responsável por levar as almas aos Infernos, mas até hoje ainda não encontrei essa vertente representada nos cemitérios, onde a simbologia de Hermes sempre aparece associada ao comércio ou (em jazigos mais recentes) à medicina.

Bastão de Asclépio - Campo Verano,
Roma, Itália
Asclépio, filho do deus Apolo - o mesmo que deu o caduceu a Hermes - foi em pequeno entregue pelo pai ao centauro Quíron, que lhe ensinou as artes da medicina. Asclépio, para além de ter aprendido rapidamente e apresentar grande habilidade na cura dos doentes, possuía ainda a capacidade de ressuscitar os mortos, usando para isso o sangue das veias do braço direito de uma górgona, que lhe fora dado por Atenas. 
Foi por esta capacidade de ressuscitar os mortos que Zeus o matou, receando o impacto que esta façanha poderia ter na ordem do mundo. Depois de morto, Asclépio ascendeu aos céus sob a forma da constelação Serpentário: um homem segurando uma serpente.

O seu símbolo identificador é um pau onde se enrola uma serpente, símbolo esse que representa a medicina.

São atribuídas a Asclépio várias filhas, todas elas associadas à arte da medicina nas suas diferentes vertentes, sendo uma dela Higia. 
Taça de Higia - Cemitério dos Prazeres,
Lisboa, Portugal
Higia é associada à saúde e representada segurando uma taça de onde bebe uma serpente. 
Reza a lenda que, quando Asclépio foi morto por Zeus, as serpentes que viviam e guardavam as fontes de águas medicinais abandonaram-nas e refugiram-se nos templos de Asclépio, onde ficavam imóveis no chão, em sofrimento. 
Higia, por afecto ao pai, cuidava dessas serpentes enlutadas, oferecendo-lhes de beber a partir de uma taça. 
É do nome de Higia que surge a palavra higiene, considerada uma das componentes essenciais à manutenção da saúde.

O símbolo identificador de Higia é a taça de onde bebe a serpente e está associado à saúde.

Internacionalmente, este símbolo é comummente associado à farmácia, mas nos cemitérios pode ser utilizado de uma forma mais ampla, significando saúde.

Recordo que os símbolos devem ser interpretados tendo em consideração os seus contextos, a época e os restantes símbolos representados. 
No contexto cemiterial, podemos generalizar que a presença de uma serpente enrolada numa taça ou num pau são motivos que simbolizam a saúde e a medicina e que uma vara com duas serpentes pode estar associado ao comércio ou à medicina, de acordo com o contexto e a época.

O caduceu num contexto onde se pretende que represente a Saúde, neste caso, a ausência de saúde - a morte -, considerando a sua inversão. Todos estes símbolos representam a morte: a tocha invertida que se apaga, a tesoura de Átropos que corta o fio da vida e a gadanha Cronos que ceifa a vida.

28.10.20

Dia de Finados

 Dia 2 de Novembro é Dia de Finados ou Dia dos Fiéis Defuntos. 

Em Portugal, o dia 1 de Novembro, Dia de Todos os Santos, é feriado religioso, uma data que remonta aos primeiros séculos da cristandade, quando se sentiu a necessidade de celebrar todos os santos conhecidos, mas também os desconhecidos, as pessoas que viviam a sua vida de acordo com o Evangelho, anónimos, mas cumpridores de todos os preceitos da fé. 

02/10/1921 - Cemitério dos Prazeres
(Foto: Salgado)

Na versão mais popular, costumam dizer que os santos já eram tantos que não havia mais dias livres para dedicar a cada um deles e, por isso, criou-se um dia que dedicado a todos.

A verdade é que, em Portugal, o dia 1 de Novembro acaba por ser dedicado à celebração antecipada do Dia de Finados, que se celebra a dia 2 de Novembro. Desconheço o motivo pelo qual o dia escolhido para feriado foi o Dia de Todos os Santos e não o Dia de Finados, como acontece no Brasil, por exemplo.

02/10/1921 - Cemitério do Alto de São João
 (Foto: Salgado)


Seja como for, 1 de Novembro, é dia de romaria ao cemitério. 

Muitas famílias portuguesas aproveitam o feriado para visitar "a terra", as vilas e aldeias de onde a família tem origem, onde por vezes ainda estão os avós e os tios mais velhos, em alguns casos, os pais e os primos. Visitam a família e, juntos, vão ao cemitério, limpam as sepulturas, põem flores, mostram bisavós em retratos de esmalte a crianças que mal sabem andar, contam-se histórias e fazem-se queixas do preço das flores, da falta de visitas, do tempo que corre e não se aproveita, conta-se do vizinho que, este ano, faleceu. 

Nas cidades a prática ainda é seguida, mas a sepulturas temporárias e as cremações levam as famílias a outros rituais.


Este ano, o dia 2 de Novembro é, também, Dia de Luto Nacional.

Alguns de nós não irão celebrar este dia da mesma forma dos anos anteriores, mas podemos sempre lembrar os nossos mortos, onde quer que estejamos: as histórias, as memórias, os cheiros e o som da voz. 

Aos nossos mortos.

02/10/1921 - Cemitério dos Prazeres
(Fotos: Salgado)

23.10.20

Direto ao Assunto: Tafófilia

A ABEC - Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais é uma entidade que congrega pesquisadores cujas as pesquisas abrangem os cemitérios e as mais diversas manifestações acerca da morte e do morrer no Brasil e promove encontros bianuais sobre a temática. Para além dos encontros, a ABEC tem vários outros projectos que visam promover e partilhar o que se tem feito neste campo, divulgando os trabalhos dos seus membros. 

Um dos projectos mais recentes da ABEC é a série de vídeos "Direto ao Assunto", em que membros da associação são convidados a apresentar e esclarecer conceitos, ajudando a criar um glossário online.

No vídeo desta semana, coube-me clarificar o que é a Tafófilia. 




30.6.20

As Mulheres e a Morte - vídeo @mort.safe

Neste sexto episódio de “As Mulheres e a Morte”, série de Taís Souza (do canal Pílulas Sombrias) sobre o estudo da morte e das temáticas da morte no feminino, estivemos a conversar sobre tafofilia, estudos cemiteriais e a história da morte em Portugal. 


Um obrigada especial à Taís Souza pela criação desta série que tem divulgado tanto a nossa paixão por esta temática. 


27.6.20

As Mulheres e a Morte

No próximo dia 29 de Junho, pelas 23:00 (19:00 no Brasil), estarei no Instagram, para mais um episódio de "As Mulheres e a Morte", fantástica série desenvolvida por Taís Souza no perfil @pilulas_sombrias que nos tem transportado pelo domínios da Morte e do Morrer, através de lugares, pessoas, arte. 

Nesta primeira temporada a série já contou com a presença de Vanessa Bortulucce, Marcia Generoso, Anna Costa, Luciana Fátima e Nani Rezende e ainda teremos mais participações.

Esta semana será a minha vez e vou falar de tafófilia, de história dos cemitérios e outros temas relacionados com as minhas pesquisas nesta área.

Contamos convosco.


29.12.19

A Casa Portuguesa nos Cemitérios - AGM 2018


Em Outubro de 2018, decorreu na bonita cidade austríaca de Innsbruck mais um encontro da ASCE - Association of Significant Cemeteries of Europe.
Foi mais um excelente momento de partilha e aprendizagem, cheio de descobertas e visitas cemiteriais, na companhia dos amigos que se vão revendo anualmente.

O tema da conferência anual de três dias foi "European Cemeteries in the European year of Cultural Heritage" para o qual propus e apresentei o meu trabalho "The Portuguese House in the Cemetery: Tradition and Popular Culture", numa versão focada maioritariamente em recolha de campo e fontes e a ser desenvolvido em maior detalhe posteriormente, mas apresentando já alguns resultados interessantes e identificação de padrões de caracterização. 

A especificidade cultural destes jazigos nacionais, com características pouco comuns fora de Portugal, foi de grande interesse para os presentes, uma comunidade constituída por tafófilos de diversos países.


Fizeram-se visitas a diversos cemitérios, como sempre se faz nestes eventos, nomeadamente ao Hauptfriedhof Wilten na cidade Innsbruck, onde se encontram peça lindíssimas e onde o sol de final do dia iluminou tudo com uma doce luz dourada, com vista para as montanhas do Tirol e também ao Friedhof Mühlau, na pequena vila do mesmo nome, onde fomos simpaticamente transportados nas carrinhas dos bombeiros de Innsbruck. 
No cemitério de Mühlau fica uma bela capela, em traços que rapidamente associamos às construções do Tirol e, estando localizado numa cota mais alta que Innsbruck, permitiu magnificas vistas em redor.

Os dias passaram depressa e ficou a promessa de, em 2019, nos voltarmos a reunir em Ghent, na Bélgica, com o tema "Heritage Cemeteries in the 21st century: use, reuse and shared use" e muitas visitas a cemitérios.