Este ano a Noite dos Museus foi celebrada de forma muito especial - e inovadora - na cidade de Lisboa.
Olhando os cemitérios como sendo um museu a céu aberto - visão já há muito difundida noutras cidades do mundo, onde as visitas aos cemitérios fazem parte dos pacotes turísticos oferecidos pelas agências de viagens - Lisboa abriu no sábado à noite os majestosos portões do Cemitério dos Prazeres e recebeu os Lisboetas (e não só) de braços abertos, mostrando-lhes o melhor que tem.
Ainda que as visitas nocturnas em cemitérios portugueses não sejam comuns, esta não foi a primeira; essa honra cabe à cidade do Porto, que a 22 de Junho de 2012 preparou uma visita guiada no cemitério de Agramonte.
Não sei números oficiais dessa visita, mas vi fotografias que mostram bastante gente.
O facto que muitas vezes é ignorado - especialmente num país como o nosso, de enraizada matriz judaico-cristã - é que existe procura para este tipo de turismo - apelidado normalmente de necroturismo, em alguns casos de forma até pejorativa - e que é essencial dar-lhe resposta.
Nisso, como em outra coisas, os irlandeses têm muito para nos ensinar: no cemitério de Glasnevin, em Dublin, existe um loja no interior do cemitério cheia de livros, canecas e outras recordações do espaço, juntamente com um museu, um café com uma pequena esplanada e um restaurante do tipo cantina: tudo no interior do cemitério. À porta param autocarros de passeio cheios de turistas que entram, entusiasmados, na companhia de guias.
É um facto que não estamos ainda preparados para este tipo de realidade, mas podemos começar a fazer o caminho, pelos pequenos passos, como os passeios e visitas guiadas.
Já há algum tempo que a Câmara Municipal de Lisboa tem vindo a aumentar a aposta na divulgação dos cemitérios lisboetas e a promover passeios temáticos muito interessantes e diversificados, mas na noite de 17 de Maio a aposta passou por um inédito passeio nocturno, seguido de um concerto de La Chanson Noire na capela.
Vários dias antes da visita já circulavam rumores - rapidamente confirmados - de que esta estaria esgotada, mas que ainda seria possível assistir ao concerto.
Efectivamente, por volta das 20:00 horas, já uma pequena multidão se estendia na ampla avenida principal que liga o portão à capela.
A primeira nota positiva que quero deixar é que é notório que a visita foi bem preparada:
- À entrada foram distribuídos mapas com o percurso, acompanhados de um folheto com os pontos de paragem, incluindo uma breve descrição e imagem de cada um;
- O Dr. Licínio Fidalgo, guia da visita, fez-se acompanhar de um megafone e um sinalizador luminoso que permitia encontrá-lo no escuro:
- Existiam holofotes com geradores (que, pelo que percebi, foram gentilmente cedidos pelos Bombeiros de Lisboa) em todos os pontos de paragem, para garantir que as peças eram vistas pelos visitantes, depois de anoitecer;
- Vários funcionários da CML estavam junto das encruzilhadas do percurso para assegurar que ninguém se perdia, seguindo um trilho não incluído no passeio;
Foi uma pena que a visita ao Jazigo Palmela tenha sido a primeira paragem do percurso.
Uma visita a um espaço exíguo e com apenas com uma porta para o exterior (por onde se fazem as entradas e as saídas), quando se tem uma pequena multidão (sem ter números oficiais, diria que estariam perto de cem pessoa) não deve ser o arranque de uma visita deste género, pois torna-se demasiado demorada e dificulta a gestão do tempo.
Ainda assim, felizmente, bastaram três grupos para que todos os visitantes conseguissem fazer a visita ao fabuloso jazigo; mas a questão principal é que o truque destas coisas é deixar o melhor para o fim: qualquer peça visitada depois do inigualável Jazido Palmela empalidece em comparação.
Teria sido arrepiante fazer o passeio na ordem inversa, não só porque teríamos mais luz para ver as peças que estão na rua, como chegaríamos ao Jazigo já com noite cerrada.
Voltando aos pontos positivos, a iluminação no interior do Jazigo Palmela foi conseguida com diversas velas acesas, o que criou um ambiente muito adequado e sombrio, impossível de conseguir numa visita diurna.
O percurso passou depois por vários pontos de destaque como o Dado Falso, a Bancada do Marceneiro, a estátua de homenagem a Sousa Viterbo e a de homenagem a Oliveira Martins.
A meio, antes de começarmos a subida em direcção à capela, ainda tivemos a oportunidade de vislumbrar uma magnifica vista sobre o rio Tejo, Alcântara e a Ponte 25 de Abril, iluminadas pelos candeeiros de rua e os faróis dos carros que cruzam a ponte.
O passeio terminou já quase pelas 22:00 horas, dando assim início ao concerto de capela cheia. Ainda que a acústica da capela não tenha sido a ideal, o concerto foi memorável.
O balanço da noite é muito positivo e penso que merece uma repetição em breve.
Garante-se público, claramente...
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