27.2.11

Cemitério de Agramonte


Durante o final do século XVIII, e o inicio do século XIX, uma verdadeira revolução varreu a Europa - e os locais habitados por europeus -, no que diz respeito à forma como a Morte era vista e gerida.

A maioria dos enterramentos eram feitos dentro das igrejas ou nos seus adros, causando graves problemas de saúde; ainda assim, e mesmo confrontados com a realidade do cheiro dos cadáveres em decomposição, que obrigavam as portas das igrejas a ficarem abertas todo o dia e toda a noite, os populares portugueses tentaram resistir valentemente à criação e utilização de cemitérios.
A situação foi de tal momo extrema que deu origem à conhecida revolução minhota da Maria da Fonte, que acabou por descer pelo país e mergulhá-lo em guerra civil, durante alguns meses.
A verdade é que, em 1835, os cemitérios públicos tornaram-se obrigatórios e único sitio possível para inumação.

Na verdade, Lisboa e Porto tinham já cemitérios públicos desde 1833, devido a uma terrível praga de cholera morbus que assolou essas cidades. Para além disso, e no caso específico da cidade do Porto, um cerco levado a cabo por tropas miguelistas causou um situação de salubridade extrema.
Foi necessário encontrar uma forma de proteger os vivos dos miasmas exalados pelos corpos em putrefacção. Foi criado o cemitério da Lapa (privado) e o do Prado do Repouso.

Em 1855, um novo surto de cholera morbus obriga ao fecho dos cemitérios privados das diversas ordens religiosas da cidade e à criação de mais um cemitério público. Agramonte é um cemitério "improvisado", criado para inumação de coléricos e tendo uma capela construida rapidamente com madeira.
A população, tendo possibilidade de escolha, elege o cemitério do Prado do Repouso como preferencial construindo belos monumentos e deixando Agramonte estagnado durante algum tempo.
As ordens religiosas, obedecendo a preceitos internos, procuram forma de manter espaços de enterramento individualizados e conseguem, no processo complexo, começar a adquirir amplos talhões nos cemitérios públicos.

Ao perceber o estigma que pairava sobre o cemitério de Agramonte, este é reestruturado em 1869, numa tentativa de torná-lo mais atractivo.
Entretanto, o cemitério da Lapa, construído num terreno pequeno, e apertado por edificações diversas que o impediam de ser alargado, deixa de ser opção para os mais ricos, ansiosos por construir monumentos faustosos, marcando para a posteridade a sua importância em vida. É necessário encontrar outros terrenos com capacidade de construção e, apesar do Prado do Repouso ser o inicialmente eleito como novo lugar para os defuntos da elite portuense, o prestigio das ordens com talhões privados em Agramonte (S. Francisco, Trindade e Carmo) torna-o , no final do século XIX, no espaço mais desejado como ultima morada.

A estatuária é rica e variada, sendo possivel encontrar nele algumas das mais originais peças cemiteriais existentes no nosso país.

É ainda de notar que uma das grandes diferenças entre os cemitérios do Norte e do Sul, para além de nos primeiros predominarem as cruzes e outras simbologias católica, é o material utilizado na construção de mausoléus. Ao sul, o branco e liso da pedra calcária torna os cemitérios locais cheios de luz; no norte, a utilização de granito, áspero e cinzento, torna-os mais sombrios e solenes, emprestando-lhes mais facilmente um ambiente de luto, muito adequado.

Como ponto de referência, o cemitério de Agramonte fica situado junto à rotunda da Boavista, um dos pontos nevrálgicos da cidade. Merece uma visita. Ou duas...

1 comentário:

  1. Gisela, venho pesquisando algo sobre arte cemiterial e me deparei com seu blog.
    Achei super interessante e gostaria de convidá-la a conhecer Lírio das Almas.
    Lá posto poemas sobre luto, dentro do lirismo que a poesia oferece.
    Por ora deixo um fraterno abraço, e seja bem vinda.

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