16.2.11

As Catacumbas de Paris - III

« Arrête ! C'est ici l'empire de la Mort. »

É com esta epígrafe do poeta Jacques Delille que os duzentos e cinquenta mil visitantes anuais das catacumbas de Paris são recebidos ao entrarem no Ossário Geral da cidade, depois de descerem os quase cem degraus e de terem esperado em pé, horas a fio, numa fila à entrada que, por vezes, dá a volta à rua e estende-se pelo jardim.

A segurança dos visitantes exige que o percurso com aproximadamente dois quilómetros nunca tenha mais que duzentas pessoas, pelo que o número de visitantes é control
ado por um sistema de torniquetes. Assim também se garante que ninguém é esquecido, se perde ou esconde lo labirinto de ossadas.

As catacumbas de Paris são uma das atracções turísticas de maior sucesso na cidade e estão abertas ao público desde 1874.

Inicialmente, depois de terem passado anos com as noites interrompidas pelo latim das ladainhas
dos padres, mais o barulho das carroças transportando os ossos dos cemitérios da cidade para os túneis das pedreiras subterrâneas, os parisienses sentiram uma natural curiosidade em visitar o ossário e passear entre as ossadas dos seus antepassados.


Perante os numerosos pedidos que iam chegado a todas as entidades envolvidas da criação e manutenção do ossário, foram disponibilizados
funcionários que acompanhavam grupos em visitas; infelizmente, houve quem se aventurasse sozinho e, algum tempo depois, descobriram-se roubos e outras formas de vandalismo.

As visitas foram formalmente proibidas e os únicos visitantes a descer às catacumbas num período de quarenta anos foram altos dignitários franceses e estrangeiros, mediante convites especiais.

Quando as visitas voltaram a ser permitidas, viram-se verdadeiras enchentes de gente que se acumulava nas galerias subterrâneas, duas vezes por mês, seguindo as indicações deixadas pelos funcionários do ossário, que haviam marcado o percurso no tecto, com fumo de vela.

Depois, claro, recomeçaram os acessos ilegais.

Munidos de velas, os parisienses desciam para passear pelos túneis subterrâneos e há mesmo relatos de picnics e festas na companhia dos restos mortais.

A mais célebre dessas ocasiões ocorreu a 2 de Abril de 1897.

Cerca de uma centena de parisienses recebeu um misterioso e anónimo convite: por volta da meia-noite deveriam apresentar-se sozinhos na entrada das catacumbas.
Descidas as escadas em silêncio, os convidados foram surpreendidos por uma orquestra com cerca de quarenta e cinco músicos e artistas, que tocaram e declamaram poesia até às duas e meia da manhã
.
Entre as músicas escolhidas contou-se a Marcha Fúnebre de Chopin, que em 1849 tinha sido tocada em Père Lachaise quando o seu autor foi a enterrar, e a Marcha Fúnebre de Beethoven, parte da 3ª Sinfonia.

Os acessos ilegais continuam, apesar de actualmente das catacumbas serem policiadas. Conta-se que em túneis mais afastados, povoados clandestinamente pelos já célebres catófilos e certamente inspirados nos relatos das aventuras do século XIX, se montam bares, salas de cinema e se dão concertos onde se ouve música, se bebe absinto e se vêem filmes de terror. Alguns desses locais são encontrados uma vez por outra pela policia, sempre desertos, recém-abandonados.

Em Setembro de 2009, as catacumbas tiveram de ser encerradas ao público; e assim permaneceram por um período de quatro meses, depois de uma noite violenta em que um grupo de vândalos conseguiu acesso às galerias subterrâneas e destruiu e desarrumou grande parte das ossadas, espalhando-as pelos diversos percursos.

Actualmente, já podem ser novamente visitadas.

Não percam a oportunidade, mas não tentem levar nenhuma recordação: para além de não ser respeitoso, os seguranças que vigiam a saída asseguram que os seis milhões de parisienses que repousam nos túneis subterrâneos continuam a ser seis milhões.



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